Por Pérsio Burkinski
A homologação é o processo pelo qual um casamento realizado em outro país é reconhecido legalmente em seu país de origem. Isso é importante porque, sem a homologação, o casamento pode não ser considerado válido ou legalmente reconhecido em seu país de origem.
Cada país possui sua legislação própria no que concerne ao casamento de estrangeiros com seus nacionais. A Convenção de Haia estabelece que documentos públicos, como a certidão de casamento, não precisam mais ser submetidos ao procedimento de legalização nos consulados. Porém, o país deve ser signatário da convenção, como no caso do Brasil.
O procedimento de legalização, nos países signatários da Convenção de Haia, simplifica substancialmente, bastando submeter o documento ao apostilamento, regulado no Brasil pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Importante saber se o país onde será apresentado o documento apostilado é, também, signatário da convenção.
A data de vigência da Convenção de Haia no Brasil é 14/8/2016 (Decreto nº 8.660, de 29 de janeiro de 2016). A partir de então, o casamento celebrado por autoridade estrangeira é considerado válido no Brasil.
O reconhecimento da validade do casamento de um brasileiro no exterior ocorre independentemente de seu registro no País.
Um caso interessante que podemos usar como exemplo é de uma Boliviana que se casou no Brasil. Com base no entendimento de que o casamento de um brasileiro no exterior ocorre independentemente de seu registro no País, os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negaram recurso da professora brasileira E.S. contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A mulher se casou, na Bolívia, com um italiano divorciado. Anos depois, veio a se casar com um militar brasileiro, também divorciado, no Rio de Janeiro. Ao julgar ação movida pelo segundo marido, o Tribunal estadual considerou nulo o casamento realizado no Brasil, posição mantida pelo STJ.
A professora casou-se com o militar em setembro de 1994, em regime de separação de bens. Quase três anos depois, ele entrou com ação de separação judicial com anulação de casamento, alegando bigamia e falsidade ideológica. Segundo alegou a defesa do militar, a mulher pretendia separar-se dele e exigia a comunhão de bens. Ele afirmou que, em 1966, em Santa Cruz de La Sierra, a professora se casou com o italiano P.B., com quem teve três filhos. Ao se casar com o militar, ocultando-lhe o impedimento, já que não se desvencilhara do matrimônio anterior, a mulher cometeu um crime. Embora o militar tivesse conhecimento do casamento anterior da professora, ela afirmara que havia se divorciado de seu ex-marido, fato que o induziu a erro essencial, fato também capitulado como crime no Código Penal.
O primeiro grau da Justiça do Rio de Janeiro julgou a ação improcedente, mas a sentença foi reformada no TJ-RJ. Ao julgar a apelação do militar o Tribunal entendeu que estando em vigor o casamento da mulher na Bolívia, o segundo enlace no Brasil é nulo. “Não é a averbação ou a transcrição do ato das primeiras núpcias no cartório brasileiro de registro civil das pessoas naturais que vai dar validade ou existência a ele”, firmou o TJ-RJ.
A defesa da mulher, então, recorreu ao STJ. Alegou que a decisão do TJ-RJ violou lei federal e opôs-se a outros julgados de outros tribunais brasileiros. Segundo afirmou, o casamento ocorrido na Bolívia em 1966 não teria validade no Brasil porque, na época, não existia a figura do divórcio no País. “Só eram registráveis, para produzir efeitos no Brasil, os casamentos de brasileiros, celebrados no exterior, que não atentassem contra lei brasileira”.
De acordo com o relator no STJ, ministro Ari Pargendler, o recurso não pode ter seguimento. Para o relator, o Tribunal estadual não violou qualquer lei, pois quando afirmou que a mulher havia se casado na Bolívia “num ato jurídico perfeito e acabado, foi no sentido de que o casamento de brasileira com estrangeiro divorciado, realizado no exterior, é valido e independe de homologação do divórcio do estrangeiro no Brasil”.
Assim, pode-se afirmar que o casamento no exterior não passa pelo processo de homologação no Brasil, sendo necessário somente o registro em cartório para que ele produza efeitos. Todavia, em sentindo oposto, quando estivermos diante de uma sentença de divórcio estrangeira, a homologação pelo Brasil faz-se necessária.
Como toda regra possui uma exceção, caso a sentença estrangeira tenha sido de divórcio consensual puro, ou seja, um divórcio que tem como fundamento somente a dissolução do casamento, sem discussões quanto à partilha de bens ou a guarda de filhos e prestação de alimentos, basta que a decisão seja levada para averbação no cartório de registro civil, sem a necessidade da homologação.
Para homologação de sentença de divórcio no Brasil leia o nosso artigo publicado em 08/12/2023.